A face Generosa da cultura
12/07/2017
Manicure que trabalha perto do instituto adorou “Janis”, visitou as obras de Nam June Paik e não perde um destaque da programação cultural
Barrinha é uma região no extremo norte de Minas Gerais com cerca de 20 mil habitantes. Foi lá que nasceu Generosa Maria da Soledade, uma das frequentadoras mais assíduas do Oi Futuro, e de lá que ela saiu há 41 anos para ganhar a vida no Rio de Janeiro. Até começar a trabalhar como manicure, na década de 1980, Gina, como é chamada pelos amigos, passou por diversas casas de famílias, onde trabalhou como babá e cuidou de crianças. Hoje funcionária de um salão de beleza na rua Dois de Dezembro – a mesma do Centro Cultural Oi Futuro, ela dedica as horas de lazer para ler, ver, ouvir e falar sobre cultura. “A cultura faz bem para a minha alma. Se eu estou triste, é só entrar em contato com ela que a tristeza vai embora”, conta Gina, sentada em um dos bancos de madeira da área externa do instituto, um dos seus locais preferidos do Centro.
“Tudo mudou para mim quando fui pela primeira vez a uma exposição do Monet e outra do Rodin, em 1998”, lembra Gina. “De lá para cá, eu me apaixonei por cultura e passei a gostar de tudo um pouco. Mas com uma condição: a obra precisa ter qualidade”, explica. Aos 58 anos , ela coleciona uma série de referências a partir das peças, exposições, filmes e livros com o quais teve contato ao longo da vida. É fã das produções do diretor Luiz Fernando Carvalho, do programa de televisão “Manhattan Connection” e tem entre seus livros favoritos algumas obras recentes das escritoras Martha Medeiros e Lya Luft.
Foi por conta desse apreço pelo que é bem escrito, filmado, montado ou exposto que ela passou a frequentar centros culturais do Rio e a conversar sobre o assunto com quem também se interessa por ele. “Othon Bastos é meu cliente há anos e sempre entendeu e deu força a este meu lado”, revela. “Outro, dia eu mandei para ele um vídeo pelo WhatsApp sobre a figura do arlequim, e ele me respondeu com um áudio sensacional que me ensinou sobre Shakespeare. E isso para mim não tem preço”, conta Gina, entusiasmada com a amizade do ator de “Deus e o diabo na Terra do Sol” e “São Bernardo”.
Simpática e sorridente, a manicure é do tipo que cumprimenta com intimidade os recepcionistas e seguranças das salas do Oi Futuro, de tanto que passeia no espaço. Ela não perde os destaques da programação cultural do instituto e tem um canto ideal, onde gosta de sentar para tomar um café e esperar pelo início das sessões. “Adoro essa área aberta do oitavo andar”, diz, enquanto aprecia a vista que dá para o bairro do Flamengo. “Só recentemente já vi por aqui ‘Janis’, a sobre Janis Joplin, a exposição do Nam June Paik, fui a um debate com o Sílvio Tendler e vi a peça ‘Love, Love, Love’, com a Débora Falabella e a Yara Novaes”, enumera. “O da Janis Joplin é uma coisa, deu para ver que a atriz se aprofundou mesmo no personagem”, emenda.
Com uma vida social ativa e cheia de eventos culturais onde quer estar, Generosa conta que, às vezes, sofre preconceito por causa dos assuntos sobre os quais gosta de conversar. “Tem gente que fala que eu sou uma simples manicure e quero pagar de culta. Mas não é isso. Quando eu vim para o Rio poderia ter escolhido outro caminho, mas escolhi o do aprendizado, o de sempre estar em busca de conhecimento”, finaliza. A julgar pelo empenho e bom gosto de Gina, a tarefa de “aprender” está mais do que cumprida. É chegada a hora agora de, quem sabe, ensinar aos outros sobre determinação, educação e, é claro, cultura.