Papo de Futuro: Cultura digital e o novo fazer pedagógico
22/08/2020
O ensino remoto online trouxe desafios, e a possível retomada dentro do modelo de alternância demanda dos professores, gestores e famílias uma nova compreensão sobre o o ensinar e o aprender. Dentro deste contexto, a série “Papo de Futuro”, organizada pelo Oi Futuro, analisa o tema “Cultura Digital e Criatividade na Formação de Professores”. No primeiro bloco, Paula Brandão, cofundadora do Baluarte Cultura, e Alexandre Rangel, professor e coordenador do NAVE, falam sobre o lançamento de dois cursos de formação continuada. No segundo bloco, a professora Débora Garofalo, gestora de Tecnologias da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo e primeira sul-americana finalista do Global Teacher Prize (premiação internacional mais importante da área), e Fábio Nakano, gerente de Programas de Educação do Google for Education, compartilham as experiências em seus campos de atuação. O “Papo de Futuro”, transmitido às quartas-feiras, às 19h, pelo canal do Instituto no Youtube, conta com acessibilidade em libras e foi mediado por Fábio Meirelles, coordenador de Educação do Oi Futuro.
“A tecnologia não é um fim, mas pode ser uma grande propulsora para um aprendizado que estamos vivenciando com a cultura digital e com o pensamento criativo”, observa Débora Garofalo. “Vamos sair da pandemia entendendo melhor como serão as demandas do profissional do século XXI, e que irão atuar, muitas vezes, em profissões que ainda não existem hoje”, prevê Fábio Nakano.
Confira abaixo dez reflexões de Paula Brandão, Alexandre Rangel, Débora Garofalo e Fábio Nakano sobre o tema “Cultura Digital e Criatividade na Formação de Professores”.
1)Os cursos de formação continuada
Em parceria com a Baluarte Cultura, empresa que atua com aceleração da transição para a cultura de sustentabilidade, e com o CESAR School, escola de inovação do CESAR – maior centro de inovação tecnológica e transformação digital do país, o NAVE lança dois cursos de formação continuada, gratuitos, 100 por cento online e com certificado digital. “Recebemos 433 inscrições, de norte a sul do Brasil”, comemora Paula Brandão. Desenhado no contexto do ensino remoto emergencial, o curso de Cultura Digital tem como objetivo ampliar o repertório das práticas colaborativas, promovendo um maior engajamento dos estudantes. Estão programados três encontros, onde serão trabalhados os temas de Cultura Digital, Facilitação e Colaboração e Educação Midiática. O curso de Introdução à Robótica Educacional, segundo Alexandre Rangel, tem como meta ajudar os alunos a desenvolver metodologias e artefatos para serem utilizados em salas de aula. A ideia é facilitar o uso da Robótica com pequenos projetos educacionais. No ano passado, um dos participantes ajudou a criar um sistema de irrigação de uma horta comunitária escolar, com base nos conhecimentos adquiridos. Em 2020, o desafio tem sido grande, com a reestruturação do curso para um formato totalmente remoto, mas a procura superou as expectativas, atingindo 370 inscrições.
2)Uma trajetória brilhante
Formada em Letras e em Pedagogia, Débora Garofalo começou a lecionar há 15 anos. “Nossos jovens utilizam muito a cultura digital, e ali enxerguei um potencial em trabalhar com a Tecnologia, como uma possibilidade transformadora naqueles meninos e meninas, que não viam a escola com o significado que ela realmente merece”. Foi quando surgiu a oportunidade de atuar com o ensino de Programação Robótica. Mas, em sua reflexão como professora, nasce algo bem maior. “Dei aula para mais de 1000 alunos, e em 70 por cento da avaliação diagnóstica, percebi que o lixo era o grande problema”. Daí ocorreu-lhe a ideia de trabalhar Robótica com sucata, transformando a vida de estudantes da periferia de São Paulo. Produzido com muita escuta ativa e atenta dos alunos, proporcionou, em aulas públicas, a sensibilização da comunidade sobre o descarte correto desses materiais, potencializando que os estudantes também fossem multiplicadores da informação. Esse trabalho tornou-se conhecido nacional e internacionalmente, pelos seus resultados expressivos. Colaborou para a questão da evasão escolar, para o combate ao trabalho infantil, as crianças começaram a ter uma autoestima, e culminou com a retirada de mais de uma tonelada de lixo das ruas de São Paulo. E mais: colocou Débora, em 2019, entre as dez melhores professoras do mundo. “O título não é o mais importante e, sim, a alegria de levar um trabalho da nossa Educação, do chão de uma escola pública, da comunidade, periférica, para o topo mais alto”.
3)Oportunidades e plataformas do Google for Education
A história da empresa começa com dois jovens, no final da década de 1990, que, com o objetivo de organizar as informações do mundo e deixá-las acessíveis a todos, apresentaram um projeto de pesquisa na Universidade de Stanford (EUA). A Google for Education é uma ferramenta gratuita, incluindo apps como o Gmail e o Google Drive. Adotada em várias escolas do mundo, incluindo o Brasil, reúne o que há de mais moderno na tecnologia para despertar o aprendizado de estudantes, de uma maneira interativa e criativa. Segundo Fábio Nakamo, apresenta três pilares: Suite for Education, que são as ferramentas gratuitas para Educação; o Chromebooks, aparelhos gerenciáveis que facilitam o processo de gestão de TI; e os recursos gratuitos, que são os apps e as extensões. A empresa dispõe de uma série de parceiros que trabalham na capacitação e transformação dos professores. Na área de programas, existem inúmeras certificações oficiais e bastante avançadas. Há, também, o Google Inovator, onde, nos próximos dois anos, 36 educadores submeterão seus projetos e terão o acompanhamento de uma equipe.
4)Os diferentes vieses de Cultura e Educação em São Paulo
Débora, que está na Secretaria de Estado de Educação de São Paulo desde junho do ano passado, conta que começou a implementar um componente de tecnologia e inovação, a partir de três aspectos essenciais: as tecnologias digitais na informação e na comunicação, o letramento digital e o pensamento computacional. “Sabemos que o tema Cultura Digital é algo que permeia muitas outras etapas. E, dentro da Secretaria, existem duas maneiras de se trabalhar: de uma forma bastante transversal, através do currículo paulista, e, especificamente, pelo componente de tecnologia e inovação. São muitos os desafios, e os professores precisam de uma atenção especial para entender que é preciso levar esses gêneros digitais para dentro das salas de aula”.
5)O Centro de Mídias
“No momento, estamos vivenciando o ensino emergencial, mas já contávamos com um projeto para alavancar o Centro de Mídias”, relata Débora, ao informar os números da Secretaria de Estado de Educação de São Paulo, uma das maiores redes da América Latina: 3,5 milhões de estudantes e mais de 200 mil professores. Com a pandemia, o Centro de Mídias foi colocado de pé em apenas 20 dias. Após um chamamento público, o parceiro doou o aplicativo, e, através deste, o estudante pode acessar os dados, que são patrocinados pelo governo de paulista. Mas, em função da grande diversidade no estado e no país como um todo, isso não bastava. Estabeleceram duas parcerias com a televisão: uma com a Univesp, para atender estudantes do Ensino Fundamental I, e outra com a Cultura, destinada aos alunos do Ensino Fundamental II e Ensino Médio. E, no dia 6 de abril, Débora fez a aula inaugural no Centro de Mídias. Quando uma parcela dos estudantes não tem acesso online nem com a TV, buscam contato telefônico com a família. “Precisamos de uma Educação conectada, que o acesso à internet não seja artigo de luxo e, sim, uma necessidade básica”.
6)Metodologias ativas e quebra de resistências
Segundo Débora, as metodologias ativas são essenciais, principalmente, nesse momento. Estabelecer estações de trabalho, colocar os alunos em salas e provocá-los com informações, utilizando um tema central. Outra grande metodologia é a sala de aula invertida, atuando em três situações: antes, durante e após. Sabe-se que o ensino híbrido vai potencializar muitas ações para o possível retorno presencial. Sobre a quebra de resistências, é hora de o professor se reinventar, e relata uma experiência vivida em seu mestrado, quando a orientadora ainda demonstrava resistência em relação a utilizar qualquer tipo de ferramenta.
7)A mudança de papel dos educadores
Para Fábio, o educador passa a ter um papel mais de facilitador e de mediador do processo de aprendizagem. Ele cita o exemplo de uma escola em São Paulo, onde foi desenvolvido, colaborativamente, um projeto com o objetivo de limpar e reutilizar a água de um córrego poluído. Os alunos uniram os professores de Química e Física para orientá-los e, utilizando ferramentas do Suite for Education, prototiparam tudo digitalmente e desenharam as possíveis soluções. Como resultado, reciclaram uma antena parabólica em desuso, aproveitando-a para a limpar a água. “Enfim, o professor pode trabalhar de diferentes formas para gerar essas provocações”.
8)O potencial da Robótica
A Robótica é ainda um braço muito forte da Cultura Maker – ideia de que as pessoas devem ser capazes de fabricar, construir, reparar e alterar objetos dos mais variados tipos e funções com as próprias mãos – avalia Débora. “Ela vai além de seus inúmeros benefícios à Educação: permite que os alunos não sejam apenas consumidores de tecnologia, mas, também, produtores, vivenciando o outro lado, e refletindo”. Hoje, existem diversas maneiras de se trabalhar a Robótica. Precisa ser um ensino contextualizado, trazendo problemas reais da comunidade escolar. É um momento muito especial para a Educação e para as tecnologias como um todo.
9)A formação de professores
O Google tem uma série de capacitações que estão disponíveis, além de parceiros oficiais para auxiliar os professores no uso das ferramentas de forma apropriada. “Uma vez o professor entendendo o que é o propósito das ferramentas, ele consegue extrapolar esse uso e dar uma significação diferente. É muito bacana, por exemplo, ver a ressignificação de um e-mail. Encontramos professores que usam o Gmail com uma cápsula do tempo, incentivando os alunos a escrever metas para que eles cumpram ao longo do ano”, conta Fábio.
10)O futuro da Educação e a presença da cultura digital
“A tecnologia já está muito presente no nosso dia a dia; não é algo distante. A crise da pandemia, embora delicada, representa uma oportunidade de um momento impulsionador para a experimentação dessas novas formas de ensino e aprendizagem. Vamos sair diferentes, entendendo mais como as ferramentas tecnológicas podem ajudar na resolução dos problemas”, ressalta Fábio. Débora diz que os professores devem incentivar, cada vez mais, os alunos e trabalhar com a questão do pensamento criativo. “Sabemos que é uma longa jornada, temos realidades diferentes. Mas, é preciso colocar tudo isso como uma meta e conectá-la ao projeto de vida dos estudantes”.